“Então
Jesus pôs-se de pé e perguntou-lhe: ‘Mulher, onde estão eles? Ninguém a
condenou?’. ‘Ninguém, Senhor’, disse ela. Declarou Jesus: ‘Eu também não a
condeno. Agora vá e abandone sua vida de pecado’.”
João
8.10-11
A passagem é bem conhecida dos evangelhos.
Muito provavelmente o subtítulo dessa narrativa em sua Bíblia, seja: “A mulher
adúltera”. Jesus havia acabado de passar a noite orando no Monte das Oliveiras.
Estava cheio de GRAÇA. Logo “ao amanhecer Ele apareceu novamente no templo”.
Como bom rabino e mestre, Marcos ressalta que “todos ficavam maravilhados com
seu ensino, porque lhes ensinava como alguém que tem autoridade e não como os
mestres da lei” (1.22). No pátio do Templo, “o povo se reuniu ao redor de
Jesus, e Ele se assentou para ensiná-lo”, conforme a tradição de sua época. O
que o Mestre não esperava era a cena que estava por vir.
Um grupo de religiosos - escribas e
fariseus – arrastaram uma mulher que havia sido pega em flagrante adultério,
“fazendo-a ficar de pé no meio de todos” (v.3). A maneira como a trouxeram,
sugere o texto – implicitamente – que ela havia caído no chão. Philip Yancey
afirma que “segundo o costume, despem-na da cintura para cima como prova de sua
vergonha. Aterrorizada, indefesa, publicamente humilhada, a mulher encolhe-se
diante de Jesus, com os braços cobrindo os seios desnudos”.
A intenção dos religiosos era bem
clara. Procurar uma acusação contra Jesus (v.6). Esse é o retrato do legalismo
quando na verdade o que menos importa é a vida. A vergonha daquela mulher foi
utilizada pelos fariseus como joguete de suas intenções sobre do que acusar
Jesus. Eles não tinham o direito de fazer isso com ela. Ninguém tem o direito
de se valer da vergonha alheia para intenção alguma.
Estes diziam a Jesus: “Mestre, esta
mulher foi apanhada em flagrante adultério. E na lei nos mandou Moisés que tais
mulheres sejam apedrejadas; tu, pois, que dizes?” (v.5).
Algumas reações de Jesus
– confesso – me deixam perplexo diante das circunstâncias. Em Lucas 4.29,
encontramos o seguinte registro: “E, levantando-se, expulsaram-no da cidade e o
levaram até ao cimo do monte sobre o qual estava edificada, para, de lá, o
precipitarem abaixo. Jesus, porém,
passando por entre eles, retirou-se”. Mas como assim? A situação era de
morte! O desejo dos religiosos era empurrar Jesus abaixo do monte. E Jesus,
porém, com a maior tranqüilidade, passa por entre eles e se retira?! Isso
mesmo! Agora, diante de um possível apedrejamento, uma cena grotesca – digamos
assim – enquanto a lei de Moisés a condenava à morte por apedrejamento para o
adultério, a lei romana proibia os judeus de realizar execuções, Jesus,
“inclinando-se escrevia na terra com o dedo” (v.6). Surreal! Alguns estudiosos
tentaram decifrar – baseados em conjecturas – o que na verdade Jesus poderia
estar escrevendo naquele momento. Longe de levantar tal questão – esse não é o
objetivo – vamos analisar o seguinte: Talvez algum dia você tenha feito o mesmo
que Jesus, com um pequeno galho de uma árvore, tenha desenhado ou escrito seu
próprio nome no chão empoeirado ou quem sabe sobre a areia ou terra mesmo; no
entanto, logos após o vento que levanta a poeira do chão, alguns minutos a mais
e pronto. O que você havia acabado de escrever some com os pequenos grãos
arrastados pelo seu pequeno galho, levados pelo vento. Apagado.
Mas os religiosos parecem não entender bem a atitude de Jesus. Eles
insistem com a pergunta; eles queriam lhe acusar de alguma forma e não era de
escrever no chão que poderiam acusá-lo. Eles precisam das palavras de Jesus.
Ponto!
As palavras Jesus penetram na alma do ser humano. Somente Ele como
ninguém, consegue descortinar aquilo que nós escondemos no mais íntimo do nosso
ser. No caso dos fariseus, as palavras de Jesus desmontam uma hipocrisia
gritante. “Aquele que dentre vós estiver sem pecado seja o primeiro que lhe
atire a pedra”. (v.7). Observem que Jesus coloca sob a mesma esteira o
escândalo sexual daquela mulher com os demais pecados cometidos pelos
religiosos. Ao contrário do que poderíamos imaginar, a pergunta de Jesus não é:
“Aquele que dentre vós nunca adulterou seja o primeiro que lhe atire a pedra”. Jesus
pega no contrapé dos religiosos. Eles não esperavam por uma resposta que
refletissem suas próprias transgressões.
“E tornando-se a
inclinar-se, continuou a escrever no chão” (v.8)
Jesus parecia estar mesmo bem seguro de suas palavras e do que estava por
acontecer. Ao mesmo tempo, podemos também considerar uma resposta um tanto
quanto arriscada, já que os fariseus zelavam pela religiosidade aparente, era
bem provável que ali algum deles poderia levantar a sua mão e jogar uma pedra
na direção daquela mulher, só para não perder a pose. Mas não é isso que
acontece. “Mas ouvindo eles esta resposta e acusados pela própria consciência”
(v.9a). A palavra de Jesus trouxe-lhes às suas consciências a condenação dos
seus próprios atos. “Foram-se retirando um por um, a começar pelos mais velhos
até os últimos”. Esse é outro ponto do versículo que me chama atenção. Por que
os mais anciãos foram os primeiros a se retirar? Talvez a consciência
tenha-lhes pesado mais? E se os mais jovens foram os últimos a se retirar,
podemos supor que houve resistência da parte de alguns? A verdade é que “ficou
só Jesus e a mulher no meio onde estava” (v.9).
Talvez se aquela mulher não tivesse sido pega em flagrante, ela nunca
teria se encontrado com Jesus.
Talvez se aquela mulher não tivesse sido pega em flagrante, ela nunca
teria repensado as suas atitudes.
Talvez se aquela mulher não tivesse sido pega em flagrante, ela nunca
teria recebido o perdão e a possibilidade de uma vida liberta do pecado.
Mas Jesus estava sentado, escrevendo no chão e “erguendo-se Jesus e não
vendo ninguém mais além da mulher, perguntou-lhe: ‘Mulher, onde estão aqueles
teus acusadores? Ninguém te condenou’” (v.10). “Respondeu ela: Ninguém, Senhor!
Então, lhe disse Jesus: ‘Nem eu tampouco te condeno; vai e não peques mais”
(v.11).
Jesus havia concedido perdão e graça ao rapaz que estava sobre a maca em
Marcos 2.5: “Vendo a fé que eles tinham, Jesus disse ao paralítico: ‘Filho, os
seus pecados estão perdoados’”. Nessa mesma passagem, Jesus havia afirmado:
“Mas, para que vocês saibam que o Filho do Homem tem na terra autoridade para
perdoar pecados” (Marcos 2.10). João ainda registra: “Jesus lhes deu essa
resposta: ‘Eu lhes digo verdadeiramente que o Filho não pode fazer nada de si
mesmo; só pode fazer o que vê o Pai fazer, porque o que o Pai faz o Filho
também faz” (João 5.19). Nessas mesmas palavras, as atitudes de Jesus revelam
um reflexo do Pai. Essas deveriam ser as mesmas atitudes de todo aquele que se
considera filho.
Desmond Tutu afirma em seu livro: “Deus não é cristão e outras
provocações” que: "[...] Fomos feitos para
proclamar o Deus do amor, mas, como cristãos, somos culpados de semear o ódio e
a suspeição”. E vou mais além: fomos
feitos para proclamar o Deus do amor, mas, como cristãos, somos culpados por
condenar o próximo e nos colocamos à parte como não tivéssemos pecados. Foi
Jesus mesmo quem disse: “Por que você repara no cisco que está no olho do seu
irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho?” (Lucas 6.41). A
grande lição que tiro do texto, amado leitor (a), é que o Deus e Pai de
nosso Senhor Jesus não tem pedras nas mãos. Quem tem pedras nas mãos é a
religião. O Deus e Pai de nosso Senhor Jesus é puro amor e graça. A religião é
condenação. Jesus não veio para julgar o mundo, mas para salvá-lo (João 12.47).